Os primeiros resultados da pesquisa “As classes trabalhadoras”, promovida pelo Centro de Análise da Sociedade Brasileira (CASB), parceria que reúne a Fundação Perseu Abramo, Fundação Lauro Campos Marielle Franco, Fundação Mauricio Grabois e Fundação Rosa Luxemburgo, foram apresentados no último dia 9/8 no auditório da instituição petista.
O estudo foi organizado em duas fases. A primeira, de ordem qualitativa, ouviu presencialmente 14 grupos focais formados por trabalhadores de empresas de plataforma da Grande São Paulo (motoristas, entregadores e profissionais dos ramos de beleza, cuidado e limpeza).
A segunda, quantitativa, consistiu na realização de 4.017 entrevistas, com pessoas economicamente ativas entre 18 e 55 anos no país todo.O levantamento promovido visa entender as mudanças do mundo do trabalho no contexto da sociedade brasileira.
Segundo o diretor da Fundação Perseu Abramo, Carlos Henrique Árabe, a iniciativa representa um esforço para colaborar com as forças democráticas e populares: “Não se trata somente de uma disputa de voto, mas sim de entender o significado desta classe trabalhadora, de modo a contribuir para que haja um debate mais amplo sobre esse tema.”
Entre os dados apresentados, destacam-se alguns números:67% dos entrevistados se identificam como trabalhadores e somente 4% se declaram empreendedores.51% estão insatisfeitos com a renda atual.64% das pessoas que atuam por conta própria têm medo de ficarem incapacitadas ao trabalho.3 em cada 10 trabalhadores executam mais de uma atividade para complementar a renda.
Os direitos trabalhistas são valorizados:
79% gostariam de ter acesso ao FGTS e 69% ao seguro-desemprego.
19% nunca participaram de sindicatos, mas gostariam de ter a experiência.
33% estariam dispostos a fazer contribuição financeira a alguma entidade sindical.
55% votariam em representantes de sua categoria para cargos ao Executivo e Legislativo.
55% são favoráveis à taxação de grandes fortunas.
40% dos que votaram em Jair Bolsonaro na última eleição presidencial concordam com a taxação de grandes fortunas.
A coordenadora da pesquisa, Jordana Dias Pereira, que integra o CASB, salientou que a etapa qualitativa foi importante justamente para se compreender a classe que vive do trabalho, de modo a subsidiar a fase quantitativa no que se refere à definição da amostragem e à estruturação das entrevistas.
Em sua apresentação, ela trouxe dados relativos à demanda por salário, proteção social e direitos e também a respeito da identidade trabalhadora e de classe média. “A ideologia do empreendedorismo parece que está perdendo força e a percepção de ascensão social das pessoas se dá pela renda”, disse.
Outros dois resultados encontrados foram o potencial de organização coletiva e a disputa de valores, com uma maioria que aprova políticas de justiça social. De acordo com Matheus Toledo, que também integra o CASB e tratou dos dois temas, a disputa por esses trabalhadores é algo que precisa ser feita.
“As pessoas não vêm por osmose e o que se tem é um terreno fértil e promissor para produzir ideias junto a esse público-alvo”, afirmou.Para a pesquisadora Adriana Marcolino, do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), o estudo tem uma aderência com o quadro global de precarização do trabalho.
“Além disso, dialoga com políticas públicas como a valorização do salário-mínimo”, apontou. Ela ressaltou ainda que os números levantados sinalizam um desafio aos sindicatos: “A questão não é não sindicalizar o trabalhador, mas sim pensar nas novas estratégias para trazer esse trabalhador para essa esfera.”
Cristina Marins, do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP), destacou o rigor metodológico da pesquisa, que é inclusive inovadora por realizar inicialmente uma investigação qualitativa e, posteriormente, uma aplicação quantitativa.
“Dessa maneira, primeiro se entende o que acontece com o trabalhador para depois partir a campo. Além disso, outro mérito é que o estudo estabelece um diálogo com outras pesquisas, identificando tendências”, ponderou.O último comentarista, Paulo Ramos, do Projeto Reconexão Periferias da Fundação Perseu Abramo, enfatizou a questão da participação social com um elemento de reflexão.
“Você tem a opinião desses trabalhadores e é preciso verificar como isso se associa às preferências partidárias e se expressa na política”, afirmou.Para ele, a experimentação da mobilidade social, a qual essas pessoas se encontram no período atual, precisa ser compreendida em um contexto maior, que leve em consideração não somente a opinião e as predileções por determinados partidos, mas principalmente a disputa de uma hegemonia cultural, o que se traduz na capacidade de agregar melhor os interesses dessas classes trabalhadoras.