O livro “Mulheres em Defesa do Território-Corpo-Terra-Águas” foi lançado no dia 1º de novembro, durante o seminário “Territórios em Disputa”, realizado na Universidade Estadual do Ceará (UECE). A publicação reúne a resistência de mais de trinta mulheres vinculadas a organizações sociais e envolvidas em lutas territoriais, ambientais e culturais em diversas regiões do Brasil. Também são destacados o processo coletivo de lideranças femininas em movimentos quilombolas, indígenas e rurais. A filósofa e escritora Silvia Federici, responsável pelo prefácio, participou virtualmente do evento, compartilhando uma análise sobre a resistência das mulheres frente ao patriarcado e ao capitalismo. O evento foi organizado pela Fundação Rosa Luxemburgo, CPDA/UFRRJ e UECE.
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Palavras iniciais e contexto
A abertura contou com falas de Camila Dutra (Naterra, Lecante, UECE), Elisangela Paim (Fundação Rosa Luxemburgo) e Fabrina Furtado (CPDA/UFRRJ), que contextualizaram a obra em um momento crítico para os territórios e para as mulheres que enfrentam as imposições do capitalismo sobre seus saberes e territórios tradicionais. As falas destacaram a urgência da defesa dos territórios e da integridade das comunidades diante da expansão de grandes empreendimentos de energia e mineração.
A força da resistência coletiva
Silvia Federici, uma das intelectuais feministas mais influentes da atualidade, participou virtualmente e trouxe uma reflexão sobre a interconexão das opressões capitalistas e patriarcais sobre os corpos femininos e os territórios. Ela ressaltou a importância das práticas ancestrais das mulheres, que enfrentam diretamente os impactos da exploração capitalista. Para Federici, a luta pelo território é inseparável da luta pelo corpo e pela dignidade humana, especialmente para mulheres marginalizadas pelo sistema econômico.
Depoimentos de lideranças
Durante o lançamento, autoras convidadas compartilharam suas perspectivas sobre a importância de fortalecer a resistência das mulheres nos territórios, enfatizando a interseção entre a defesa do corpo e da terra.
Cleomar Ribeiro da Rocha, do Quilombo do Cumbe, ressaltou que a luta quilombola é essencial para preservar saberes ancestrais e a cultura local que estão ameaçados pela privatização e por pressões econômicas sobre os direitos territoriais. Ela enfatizou que as mulheres são pilares desse fortalecimento comunitário, mantendo vivas tradições fundamentais à sobrevivência da comunidade.
Cristiane Faustino, do Instituto Terramar, abordou a complexidade da luta das mulheres negras e indígenas, que resistem ao racismo ambiental e são defensoras de uma existência plena. Ela destacou que a liderança feminina incorpora demandas múltiplas, como território, saúde e segurança alimentar, criticando a invisibilização das mulheres em processos políticos e organizativos.
Josimeire Lemos, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), apontou a importância do movimento coletivo para garantir a dignidade das comunidades camponesas, destacando como as práticas agroecológicas recuperam modos de vida tradicionais. Para Lemos, a agroecologia não é apenas uma alternativa econômica, mas também uma forma de resistência ao agronegócio e à destruição ambiental.
Rafaela Lopes de Sousa, doutoranda em Geografia pela UECE, complementou a discussão com contribuições teóricas que reforçam a luta territorial. Ela afirmou que o livro, embora ancorado em vivências práticas, compromete-se com a construção de um saber feminista, antirracista e contra-colonial, enriquecendo o debate acadêmico sobre o direito ao território.
Diálogo e engajamento com o público
Mediado por Katarine Flor, da Fundação Rosa Luxemburgo, o diálogo com o público — composto por estudantes, ativistas e membros de movimentos sociais — foi conduzido em uma dinâmica calorosa, promovendo discussões sobre a necessidade de criar espaços que conectem academia e território, saber técnico e saber ancestral. Flor ressaltou a importância de expandir o olhar da luta feminista, incluindo cada vez mais as vozes indígenas, quilombolas e periféricas.
O evento reafirmou o compromisso das mulheres com a defesa da terra e do território, pautas que ultrapassam o campo ambiental e abrangem questões de gênero, raça e classe. A obra lançada representa uma contribuição essencial para uma sociedade que reconheça e valorize as formas de existência e resistência tradicionais, entendendo que defender os territórios é também proteger a vida e a identidade dessas mulheres.