Germany Needs Federal Rent Control
Como o governo alemão que está de saída não chegou a um acordo para estender o controle do preço dos aluguéis implementado há quase uma década, essa lei deve expirar em 2025. De qualquer forma, a legislação existente não teve praticamente impacto nenhum, e os inúmeros outros regulamentos relativos à lei do inquilinato alemã pouco fizeram para garantir uma proteção adequada a inquilinos e inquilinas, enquanto os proprietários continuam lucrando alto.
A introdução de um teto nacional do aluguel pode impedir o aumento vertiginoso dos preços e garantir que a moradia seja acessível, restringindo o valor do reajuste nos contratos existentes, implementando limites de preço nos novos contratos e reduzindo o número de aluguéis abusivos. O texto a seguir apresenta um panorama das medidas legais que podem dar o alívio necessário à população que mora de aluguel na Alemanha.
Por que precisamos de um teto nacional no preço dos aluguéis?
O preço do aluguel não sobe do nada – são os proprietários que deliberadamente aumentam os valores. Há uma razão pela qual, em muitas cidades e regiões, inquilinos e inquilinas estão pagando mais por moradia: os proprietários estão cobrando cada vez mais caro pelo aluguel. Em toda a Alemanha, os contratos de locação existentes aumentaram, em média, 14% desde 2014. Os dados do censo mais recente mostram que, nas grandes cidades, esse aumento chegou a quase 25%. O aumento no valor dos novos contratos de aluguel nas principais cidades é ainda mais acentuado, ultrapassando 40% desde 2014. Em cidades como Potsdam e Leipzig, os valores pedidos em novos contratos aumentou mais de 50% na última década e, em Berlim, esse número chegou a dobrar.
Se o atual controle de preços das locações perder a validade neste ano, efetivamente não haverá mais uma forma de limitar os aumentos pela lei do inquilinato. Restariam apenas leis no direito penal comercial para evitar a cobrança de valores abusivos, mas é quase impossível implementar esses dispositivos em sua forma atual. Além disso, as famílias estão sobrecarregadas com o aumento dos custos de calefação, que subiram em média 43% desde 2021.
O aluguel alto empobrece a população. Pelos motivos mencionados acima, muitas pessoas na Alemanha já sentem o peso excessivo do custo do aluguel. O gasto com moradia não deveria ultrapassar 30% da renda familiar, incluindo custos de manutenção e calefação. No entanto, esse limite é ultrapassado para uma em cada três famílias que vivem no aluguel, e uma em cada seis despendem mais de 40% da renda com moradia. Quando grande parte da renda, muitas vezes modesta, vai para o aluguel, sobra pouco para as pessoas viverem.
O aluguel alto impede a distribuição justa e razoável do acesso à moradia. Muitos adultos de meia-idade permanecem em apartamentos grandes depois que os filhos se mudam, quando já não precisam mais de todo aquele espaço. Mas há uma alta demanda justamente por esse tipo de apartamento, sobretudo entre famílias jovens e repúblicas. Por haver uma grande disparidade entre os preços de contratos existentes e novos, há pouco incentivo para que as pessoas nessas situações se mudem para apartamentos menores. Especialistas do setor imobiliário falam inclusive no “efeito de aprisionamento” (“lock-in effect”), porque cada vez menos gente consegue mudar de casa, mesmo quando a moradia atual não está mais adequada às circunstâncias de vida.
O aluguel alto aumenta a desigualdade social. Na Alemanha, mais de 44 milhões de pessoas vivem em cerca de 23 milhões de unidades de locação. Quatro milhões de proprietários recebem renda e geram receita e lucro a partir dos pagamentos regulares de valores de aluguel retirados da renda e das aposentadorias de locatários e locatárias. Todo ano, são pagos cerca de 150 bilhões de euros em aluguel. No entanto, o custo real de manutenção, reparos, administração e prestação de serviços para essas propriedades representa apenas 60 bilhões de euros. Os outros 90 bilhões representam um acúmulo de riqueza ou lucro, sobretudo para proprietários particulares e empresas privadas.[1] Os aumentos nos preços dos aluguéis têm um papel importante nesse processo de redistribuição da riqueza da base da ordem social para o topo.
O aluguel alto aumenta a despesa pública. Aluguéis mais altos também levam a um aumento nos gastos do Estado com custos de moradia e subsídios habitacionais (Wohngeld). Em 2023, o subsídio dos aluguéis representou 21 bilhões de euros que saíram do bolso dos e das contribuintes – 4,3 bilhões de euros foram para subsídios habitacionais e 16,6 bilhões de euros, para custos com moradia (sendo 11,6 bilhões de euros do governo federal e 5 bilhões dos municípios). Esse número representa um aumento de 43% em relação a 2019.
Como funcionaria um teto nacional do preço dos aluguéis?
A implantação de um teto nacional do aluguel restringiria os reajustes nos contratos existentes, limitaria os aumentos nas renovações de contrato e reduziria os valores abusivos.
Combinando diversos dispositivos regulatórios, o teto nacional do aluguel também levaria em consideração as diferenças regionais na dinâmica do mercado. O plano para a implementação de um teto, cujas principais características nós já desenvolvemos em 2021, diferencia:
- áreas com “mercados habitacionais desaquecidos” (onde o preço médio dos anúncios de aluguel fica, no máximo, 15% acima dos valores de contratos já existentes; a taxa de desocupação é superior a 3%; e não há crescimento populacional),
- áreas com “mercados habitacionais aquecidos” (onde o valor médio dos anúncios supera os 15% dos contratos existentes; a taxa de desocupação está abaixo de 3%; e há crescimento populacional) e
- áreas com “déficit habitacional” (onde o preço médio dos novos anúncios fica acima de 30% dos contratos existentes; a taxa de desocupação é inferior a 2%; e há crescimento populacional).
Combinando elementos do direito penal comercial e da lei do inquilinato que já foram aplicados com sucesso no passado, é possível implementar um teto nacional do aluguel de forma rápida e sem obstáculos legais.
Enquanto o teto nacional não é implementado em sua totalidade, é necessário introduzir imediatamente um congelamento temporário no valor dos aluguéis já existentes, tanto em áreas com “mercados habitacionais aquecidos” quanto onde há “déficit habitacional”. Os aumentos do valor de locação em outras regiões também devem ficar dentro do limite de 2% ao ano.
Um teto nacional com gradações regionais, a ser implementado durante o congelamento temporário do preço dos aluguéis, consistiria em quatro pilares:
- Definição de um padrão de preço dos aluguéis com base nos contratos atuais (em todas as áreas): Há uma série de medidas legais relativas à lei do inquilinato que se baseiam no chamado “aluguel padrão local”. Esses valores são determinados por meio de pesquisas de índice de aluguel dispendiosas para apartamentos de diferentes anos de construção, tamanhos e localizações. Esse processo também leva em conta apenas as unidades habitacionais que sofreram mudanças nos últimos seis anos (geralmente relacionadas a novos contratos de aluguel e reajustes).
Como parte de um teto nacional, deve-se estabelecer de forma ampla – ou seja, contemplando os diferentes tipos de área – um aluguel médio real com base nos aluguéis reais pagos. Análises de amostras revelam que os preços de referência para locação definidos dessa maneira seriam até 10% menores do que os resultados obtidos pelos métodos de cálculo atuais. Esse primeiro passo, por si só, poderia representar um alívio significativo.
Os valores de referência propostos aqui podem ser definidos com base em pesquisas de microcenso ou registros regionais de aluguéis. Os valores de referência devem ser ajustados de acordo com o ano em que os apartamentos foram construídos e suas características, mas não de acordo com sua localização. - Limitação dos reajustes: Em regiões sem “mercados habitacionais aquecidos”, os reajustes planejados (até o valor de referência) devem ser limitados a, no máximo, 10% a cada três anos. Em regiões com “mercados habitacionais aquecidos”, os reajustes devem ser limitados a, no máximo, 6% a cada três anos. Em áreas com “déficit habitacional”, não seria possível aplicar reajustes.
Nos três tipos de área, será aplicada uma cláusula de dificuldade econômica, permitindo aumentos correspondentes ao aumento dos custos operacionais (de acordo com II. BV). Os custos com reforma de, no máximo, 1 euro por metro quadrado podem ser contabilizados no aluguel. - Restrições ao aumento do aluguel com novo contrato: Em áreas com “mercados habitacionais desaquecidos”, o preço da locação estipulado em um novo contrato não pode exceder 10% da média dos contratos já existentes. Em áreas com “mercados habitacionais aquecidos”, esse limite será fixado em um máximo de 6% acima dos valores de referência. Nesse caso, o teto do aluguel teria um efeito semelhante à legislação do controle do preço dos aluguéis, mas de forma mais rígida. Em áreas com “déficit habitacional”, o valor dos novos contratos deve ser limitado ao preço do valor de referência.
- Redução dos aluguéis abusivos: Os aluguéis que ultrapassam 20% dos valores de referência devem ser reduzidos em todas as áreas. Isso deve ser aplicado pelo direito penal econômico, para que as pessoas que vivem no aluguel não tenham que registrar a reclamação diretamente.
Quais são os benefícios de um teto nacional no preço dos aluguéis?
Alívio financeiro para muitas pessoas: O teto nacional do aluguel representaria um limite substancial dos reajustes, uma vez que os novos valores médios reais de locação são mais baixos do que os preços atuais do índice de aluguel. Isso proporcionaria alívio para muitas famílias em todas as cidades e regiões. Em áreas com “déficit habitacional”, o reajuste do aluguel seria proibido; em mercados habitacionais aquecidos, os preços aumentariam menos e em um ritmo significativamente mais lento do que o atual.
Habitação para todas as pessoas, não só para aquelas de alta renda: Em áreas com “mercados habitacionais aquecidos” e naquelas com “déficit habitacional”, os preços dos novos contratos seriam limitados, dando às famílias de baixa renda melhores chances de encontrar moradia a preços acessíveis.
Mudança de acordo com a necessidade, não por uma distribuição injusta: A limitação nos preços dos novos contratos também criaria incentivos financeiros para certos grupos populacionais se mudarem para apartamentos menores. Isso poderia contribuir para uma distribuição mais justa e um uso mais eficiente da oferta habitacional existente, uma vez que permitiria que mais pessoas vivessem em apartamentos que atendessem de forma adequada às suas necessidades específicas.
Aluguel acessível para muitas pessoas, não lucros elevados para poucos: A redução dos aluguéis abusivos não só permitiria que mais famílias encontrassem moradia a preços acessíveis, como também poderia contribuir para atenuar um fator relevante da desigualdade: a redistribuição da riqueza para as classes mais altas por meio da renda dos aluguéis.
Traduzido do inglês por Aline Scátola.
Andrej Holm é cientista social da Universidade Humboldt de Berlim. Seus enfoques de pesquisa são gentrificação e política habitacional.
Legenda da foto: Um teto nacional do aluguel seria uma ferramenta poderosa para limitar a escalada de preços em situações contrastantes e reduzir custos excessivos com locação em toda a Alemanha.
CC BY-SA 4.0, Foto: Wikimedia Commons / Don-Else
[1] Estimativas baseadas nas conclusões de pesquisa de Manfred Klose e Norbert Schwarz. Em uma estimativa aproximada e simplificada com base em dados de 2022, a informação média disponível sobre a área habitável dos apartamentos alugados (74,5 m²) e a média líquida do valor de locação (€ 7,40/m²) foi multiplicada pelo número de agregados familiares alemães que vivem em apartamentos alugados (22.881.000). Os cálculos feitos pelo setor imobiliário pressupõem que os custos administrativos, de manutenção e de gestão representam cerca de 40% da receita recebida por aluguel.