O primeiro Seminário ‘Cozinhas Solidárias: subsídios para a experiência brasileira, diálogos sul americanos’ foi realizado no dia 5 de outubro, em Brasília (DF). O evento foi organizado pela Fundação Oswaldo Cruz em parceria com a Fundação Rosa Luxemburgo. O objetivo da atividade é acentuar o diálogo entre as experiências de Cozinhas Solidárias dos movimentos populares de países da América Latina com a regulamentação da lei que cria o Programa Nacional Cozinha Solidária.
Em um primeiro momento, Patrícia Gentil, diretora do Departamento de Promoção da Alimentação Adequada e Saudável do MDS (Ministério de Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome), apresentou o estágio em que o PNCS está. O programa instituído pela lei 14.628 de julho deste ano, foi inserido como Equipamento Público de Segurança Alimentar e Nutricional, EPSAN. Somam o EPSAN, os Restaurantes Populares, Cozinhas Comunitárias, Banco de Alimentos e as Centrais de Agricultura Familiar.
Até o fim de agosto, o MDS mapeou 2.414 Cozinhas Solidárias e Comunitárias em todo país. Para dar o acesso às doações públicas do Programa de Aquisição de Alimentos, o PAA, foram necessários dois filtros, o primeiro tem a ver com o funcionamento, do total, 1.816 funcionam em tempo integral ou reduzido, o segundo é o CNPJ, tendo uma amostra de 1.045 cozinhas. A estimativa é que 5,1 mil toneladas de alimentos para as cozinhas, o que dá 12,8 milhões de refeições. Ainda existem alguns desafios que precisam ser estruturadas repostas, como as diversas realidades das cozinhas distribuídas nacionalmente, o apoio financeiro e suas implicações com a legislação e as adequações higiênico sanitárias.
COZINHAS SOLIDÁRIAS NA AMÉRICA LATINA
Na segunda parte da manhã, a mesa ‘Cozinhas Solidárias de Movimentos Sociais no Cone Sul’ reuniu experiencias da Argentina, Colômbia e Uruguai. Da Argentina, Maria Claudia Alboroz trouxe a experiencia desde as cozinhas da organização La Poderosa e a luta pelo reconhecimento salarial das cozinheiras comunitárias. Na Argentina são 35 mil cozinhas comunitárias, onde trabalham quase 135 mil pessoas, atendendo cerca de outras 10 milhões de pessoas.
“Na Argentina estamos caminhando faz um tempo com as companheiras das cozinhas comunitárias em função de que consigam um salário, um reconhecimento salarial pelo trabalho que vem realizando, é absolutamente justo que recebam um reconhecimento laboral, ou seja, direito a licenças, direito a férias”, aponta Maria. Há um projeto de lei que assegura os direitos trabalhistas e a base do salário das cozinheiras no Congresso da Nação Argentina que pode ser votado nos próximos dias.
Tanto Rainel Gárcia, do Congreso de los Pueblos da Colômbia, quanto Matías Carámbula Pareja, da Universidad de la Republica do Uruguai, fizeram a apresentação de suas experiencias de forma remota. Ambos apontaram para o desafio de compreender o papel do Estado frente à organização dos movimentos populares. O desafio é que as políticas públicas que tem como objetivo a instalação e melhoria de Cozinhas Solidárias rompa com a reprodução de políticas de assistência, e garanta organização, autonomia, resistência e consciência.
DEMOCRACIA NAS COMUNIDADES
“Antes de tudo é importante mencionar que estas experiencias exitosas de cozinhas solidárias existem porque nós, movimentos populares sempre levantaram a bandeira da Soberania Alimentar, e que nosso objetivo sempre foi garantir que a produção de alimentos saudáveis chegasse a quem mais precisava, que é quem passa fome”, apresentou Anderson Amaro, da direção nacional do Movimento dos Pequenos Agricultores, o MPA, durante a mesa ‘Cozinhas Solidárias no Brasil’, que reuniu movimentos populares do Brasil que atuam na construção destas cozinhas.
Camila de Caso, assessora do deputado federal Guilherme Boulos (Psol-SP), autor da lei que instala o PNCS, abordou a forma dialógica com que o projeto da lei foi apresentado, a partir das experiências dos movimentos. O Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, o MTST, e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, o MST, assim como o MPA, apresentaram elementos a partir de suas experiências e metodologias de organização destes espaços.
Para Carla Bueno, do MST, as Cozinhas Solidárias são espaços de reprodução da vida e que para a garantia de alimentos saudáveis é necessário o acesso à terra. “Precisamos fazer a luta pela terra e entender que alimento saudável faz parte do debate da soberania alimentar no sentido de poder decidir sobre o que queremos produzir, como produzir e, finalmente, o que teremos no prato de comida dos brasileiros e das brasileiras”.
A coordenadora nacional d projeto Cozinha Solidárias do MTST, Ana Paula Perles Ribeiro, defende que as cozinhas solidárias são um espalho de radicalização da democracia. “As cozinhas solidárias, elas se consolidam como um espaço inicialmente de entrega de alimentos, na contribuição com outras iniciativas de redução da fome, mas também como um espaço de amplo diálogo, de várias atividades, de discussão de diversas, inclusive no debate da democracia”.
Para que o Programa Nacional Cozinha Solidária consiga se efetivar e garantir que os alimentos cheguem a quem mais precisa será necessário avançar nas construções de governança e gestão. “Podemos ter uma política pública inovadora que garanta a compra dos produtos da agricultura camponesa familiar e o acesso a quem mais precisa, mas isso se dará se houver uma inovação social na intenção de se fazer uma parceria entre o público e o popular, ou seja, entre os movimentos populares e o Estado”, completa Anderson.