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Por Wagner Giron De La Torre, Gazeta de Taubaté
Nesta era do poder do dinheiro e da propaganda, existem várias coisas que parecem ser mas não são.
O monocultivo do eucalipto é uma delas: parece floresta, mas não é.
Uma floresta de verdade é constituída pela biodiversidade e não por um único espécime, como o eucalipto. Por exemplo, na Mata Atlântica, temos mais de trezentas espécies vegetais por hectare, sem contar com a fauna imensurável.
Em meio aos estéreis eucaliptais, cultivados por grandes papeleiras para produção de celulose, a maior parte delas exportada para os EUA, Europa e China, inexiste ciclo de vida, pois animal algum conseguiria estabelecer habitat no seio de uma plantação de árvores clonadas que não geram alimento e que são cortadas de cinco em cinco anos.
Nos vastos monocultivos industriais que hoje dominam a paisagem do Estado, insetos e animais benéficos como borboletas, besouros, joaninhas, abelhas, anfíbios, tatus, etc., estão praticamente extintos pelo uso intensivo de agrotóxicos, como herbicidas à base de glifosato e formicidas de sulfluramida, que sustentam a expansão em escala oceânica dessa fronteira do agronegócio.
Os pesticidas de sulfluramida, comercialmente conhecidos como Atamex ou Mirex, utilizados em larga escala nos monocultivos, de tão nocivos ao ambiente, fortemente cancerígenos, são proibidos pela Convenção de Estocolmo, subscrita pelo Brasil e por mais de 152 países. Mas, mesmo assim, esses venenos são diuturnamente aplicados, face à omissão dos órgãos fiscalizadores do Estado, em meio aos gigantescos eucaliptais produtores dessas commodities, das mais lucrativas do mercado.
Segundo dados oficiais, em 2014 as commodities de celulose foram as mais exportadas para a China, a um lucro líquido por tonelada de cerca de 600 dólares, atividade das mais rentáveis do setor.
Não sem motivo, o Brasil é o campeão mundial na incidência de agrotóxicos, abarcando 18% do mercado mundial, com descarte, em nosso solo, de 780 mil toneladas a cada ano.
Além da abertura de milhares de quilômetros de estradas clandestinas nos eucaliptais, sem qualquer monitoramento pelo omisso sistema fiscalizatório, essas árvores exóticas têm suas mudas alteradas em laboratório para serem imunes aos efeitos dos pesticidas e para terem crescimento recorde, de cerca de 5 anos entre o cultivo e os cortes rasos, ciclo de manejo curtíssimo, que impede o estabelecimento de qualquer estrutura básica de vida e que expõe milhares de hectares de morros e encostas da região à total desproteção, com aprofundamento da esterilidade do solo e seu processo de erosão.
Estima-se que, em média, cada árvore de eucalipto absorva cerca de 30 litros de água potável ao dia, gerando um desequilíbrio hídrico sem precedentes.
Só no Vale do Paraíba temos cerca de 300 mil hectares recobertos com o monocultivo. No país todo, a produção dessa commodity alcança mais de 5 milhões de hectares. Estamos a falar de bilhões de árvores exóticas.
Até hoje, no Estado de São Paulo, não se consolidou nenhum mecanismo de controle dos danos socioambientais de atividade industrial tão impactante.
Como se disse, imperativos eleitoreiros e econômicos impedem esse necessário monitoramento.
Porém, a crise hídrica que hoje nos cerca, está a exigir não só uma moratória a atividade tão nociva aos ecossistemas, como impõe aos omissos gestores um mínimo de responsabilidade ambiental para imediatamente criar-se sistema básico de controle sobre a expansão irrefreada de segmento industrial tão degradante, que gera pouquíssima ou quase nenhuma renda nas regiões afetadas, deixando, porém, um passivo socioambiental que a sociedade e os sistemas naturais não têm mais condições de suportarem. No limite, o que se exporta é nossa água, que, sabemos, está em vias de faltar até mesmo ao consumo humano.
A quem interessa essa lógica?
Wagner Giron De La Torre é Defensor Público. Artigo publicado originalmente na Gazeta de Taubaté, 10/02/2015.
Imagens: fotos de Tsun Ho e Hector Milla via Flickr.