O autor do livro “República de Segurança Nacional”, Rodrigo Lentz, analisa o comportamento dos militares na disputa política após a vitória e posse de Lula
Militarismo na política brasileira – pós eleições de 2022
03/04/2023
por
Rodrigo Lentz[1]

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Brasília (DF), 08/01/2023 – Golpistas invadem prédios públicos na praça dos Três Poderes – Foto: Joedson Alves/Agencia Brasil

Às vésperas do início do processo eleitoral de 2022, havia escrito uma análise da conjuntura brasileira com enfoque no comportamento dos militares na disputa política[2]. Neste texto refaço o mesmo caminho, agora depois da vitória e da posse do atual presidente da república, Luís Inácio Lula da Silva (Partido dos Trabalhadores), alçado para seu terceiro mandato na direção do país com a maior votação recebida por um candidato nos 200 anos de república.

No olhar pré-eleitoral, um improvável golpe militar clássico seria substituído pelo uso massivo de desinformação, desestabilização do sistema eleitoral protagonizada por militares da ativa e da reserva, risco de radicalização das polícias e uso da violência política. No caso de uma provável derrota eleitoral, a aposta do militarismo político seria produzir um impasse institucional que legitimasse, em nome do restabelecimento da ordem, um “papel moderador” das forças armadas. Em português sem camuflagem, um golpe de estado que resultasse na manutenção dos militares no poder.

Porém, com a descrença do setor econômico, oposição do judiciário e isolamento internacional – incluindo rechaço do governo Biden (EUA) – o legislativo e a mobilização popular seriam os dois fios da balança que poderiam garantir, na dimensão doméstica, tanto o resultado eleitoral quanto a posse do presidente eleito sem grandes sobressaltos.

Tratam-se de novos capítulos da crise da democracia brasileira irrompida em junho de 2013. Divido em três pílulas que buscam reproduzir os desafios políticos daquele momento – garantir a eleição, tomar posse e começar a governar – destacando o papel dos militares nessa disputa pelo poder político nacional.

OPERAÇÃO ELEIÇÕES

A operação militar de desestabilização do sistema eleitoral foi facilitada quando o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luis Roberto Barroso, convidou as Forças Armadas para integrarem uma comissão de fiscalização do processo eleitoral. Então presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE)[3], o lavajatista Barroso repetiu prática histórica dos civis: tentou cooptar a liderança militar – neste caso, o ministro da defesa, general do exército Paulo Sérgio Nogueira – contra os “desejos autoritários” do capitão Bolsonaro.

Como também a história mostra, as lideranças militares sabem dessa intenção, dissimulam a cooptação, mas, na prática, seguem sua própria agenda política. No caso de Nogueira, o objetivo era manter os militares no poder através da desestabilização do processo eleitoral e das instituições constitucionais até que aceitassem uma modulação institucional capaz de assegurar esse objetivo. Tais ações eram planejadas por generais e coronéis, tendo o capitão-presidente apenas o papel mais eloquente.

Enquanto isso, através do ministério da defesa transformado abertamente em um ministério das forças armadas, a dubiedade da coação camuflada na colaboração foi a tônica do comportamento dos militares durante o processo eleitoral. A nuvem da suspeição das urnas eletrônicas foi dirigida por generais e alimentada por coronéis integrantes dessa comissão, a ponto de se chegar a exoneração de um deles por sistemática desinformação sobre a urna eletrônica[4]. É possível afirmar que apenas na terceira presidência do tribunal, assumida pelo ministro do STF Alexandre de Moraes, a operação de desestabilização foi neutralizada e perdeu força. Tanto que a atuação firme, mas calculada de Moraes, lhe rendeu o posto de inimigo número 1 do bolsonarismo e grande defensor da democracia e de seu processo eleitoral por amplos setores da sociedade brasileira[5].

Para além da operação de desestabilização do processo eleitoral, a candidatura militar Bolsonaro/Braga Netto dispendeu de todos os meios governamentais entendidos como necessários para ganhar as eleições. Nos três meses que antecederam o pleito o governo distribuiu R$ 200 bilhões de reais em assistência social temporária[6] e, entre o primeiro e o segundo turno, o banco público controlado pelo governo liberou R$ 7,6 bilhões em empréstimos para cerca de 3 milhões de pessoas[7].

No lado de fora dos quartéis, as comemorações de 7 de setembro (dia da independência) novamente foram aparelhadas para uso eleitoral. Considerando-se um evento tradicionalmente militar, os desfiles de tropas nas ruas receberam conotação eleitoral indireta, com generais se camuflando nas ordens “do comandante-em-chefe” e no culto ao patriotismo[8]. Dentro dos quartéis, o clima era de amplo engajamento nas candidaturas militares – 1.257 candidaturas movimentavam a “família militar”[9] – e identificação com a candidatura à reeleição da chapa militar. Enquanto isso, era alvo de perseguição disciplinar aquele militar que se posicionasse publicamente a favor da outra candidatura e criticasse a leniência dos comandantes diante da sistemática violação do estatuto dos militares. Foi o caso do coronel Marcelo Pimentel que, mesmo na reserva, passou a responder inquéritos no Exército[10].

Apesar dessa ampla ofensiva sobre o eleitorado e o processo eleitoral, a chapa militar que perdeu o primeiro turno partiu para suas “últimas cartadas” no campo político e, sobretudo, policial. O ápice desse aparelhamento foi a operação realizada pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) na véspera e no dia da votação na região nordeste do país, amplamente favorável à candidatura de Lula[11].

O ato de abuso de poder gerou grande comoção durante o dia do pleito e, depois de cerca de 4 horas do fechamento das urnas, se conhecia a derrota da chapa militar com multidões no país tomando as ruas para comemorar a vitória da oposição. O rápido reconhecimento do resultado por autoridades do legislativo, judiciário e internacionais, inclusive de Biden nos EUA, foi a pá de cal na derrota. Mas ainda viria outra batalha a ser travada pelos generais: evitar a posse de Lula.

PROCESSO DA POSSE

Após alguns bloqueios de estradas e episódios de violência política em regiões com apoio majoritário à chapa militar – como Santa Catarina e Roraima – o inconformismo dos derrotados foi rapidamente canalizado para as portas de quartéis no país. Mantendo o silêncio, Bolsonaro, Braga Netto e Heleno se negavam a reconhecer a vitória da oposição. Considerando o amplo isolamento social, isso manteve o discurso de fraude e foi decisivo para mobilizar os acampamentos que pediam uma “intervenção federal” das forças armadas visando um golpe de estado.

Braga Neto foi o responsável por comandar de Brasília o “Quartel General do golpe”, articulando com parlamentares que permaneciam fiéis, base de militares da reserva e familiares de militares da ativa, o principal público dos acampamentos[12]. Além disso, coordenava o financiamento junto a empresários do agronegócio e comércio. Por sua vez, Heleno se mantinha à frente do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), responsável por fornecer informações e tentar desestabilizar o gabinete de transição do novo governo[13].

Para manter a mobilização de apoiadores, novamente a dubiedade discursiva dos generais governistas se mostrava fundamental. Após dez dias do resultado eleitoral, Nogueira apresentou um relatório final da participação das forças armadas na comissão de fiscalização em que não se teria identificado fraude ou inconsistências, mas também não se poderia afastar o risco de que possam existir[14]. Quer dizer, se reafirmou a dúvida sobre o processo eleitoral que tinha como pauta um golpe de estado.

Com a crescente cobrança de autoridades e da opinião pública, os comandantes do Exército, general Freire Gomes, da Marinha, Almirante Garnier Santos, e da Aeronáutica, Baptista Júnior, vieram a público logo após a nota do ministro da defesa para endossar o espírito do golpe: avocando a si mesmas um “poder moderador” em caso de conflito entre os poderes constitucionais, criticaram as “restrições de direitos” promovidas pelo poder judiciário, cobraram resposta do legislativo para corrigir “possíveis arbitrariedades ou descaminhos autocráticos” e defenderam as “manifestações populares” em frente aos quartéis como “ordeiras e pacíficas”[15].

Com ordens judiciais às policiais militares estaduais para desmobilização dos acampamentos antidemocráticos em áreas militares, comandantes de quartéis dissimulavam o descumprimento, mantendo a proteção aos acampados. Em diversos casos, discursando à tropa abertamente pela desobediência às ordens de “outros poderes”. Demonstrando um discurso coeso, generais defendiam que as manifestações eram “ordeiras e pacíficas”, mesmo discurso adotado por Bolsonaro após sair do silêncio, sem reconhecer o resultado eleitoral. Nas palavras do general Campos Allão, porque “o mal vai ser vencido com o bem” [16].

Para completar o cenário de contestação da autoridade do presidente eleito, os então comandantes ameaçavam antecipar a saída para não prestar continência “por razões políticas”[17]. Foi nesse contexto que Lula optou por uma estratégia bastante conciliatória, adotando critérios conservadores em relação às principais decisões que precisava tomar para tomar posse:

  • Primeiro, não se instalou um Grupo de Trabalho para a transição na pasta da defesa – o mesmo se fez na área de Segurança Institucional e Inteligência, tendo apenas a criação tardia de um GT.
  • Segundo, nomeou como ministro da defesa José Múcio, um político da direita tradicional e conservadora, com amplo trânsito entre autoridades dos três poderes e simpatia do Exército – seu nome recebeu aprovação inclusive de Hamilton Mourão, eleito senador e uma das principais lideranças do generalato partidário[18].
  • Terceiro, adotou o critério de antiguidade para a troca de comandos das forças – critério que elimina a margem de influência do poder político e faz prevalecer a política militar na organização, comandada por generais de quatro estrelas – em sua maioria partidarizada na última década;
  • Quarto, garantiu a entrega do ministério da defesa para as forças armadas, sem alteração de cargos políticos da alta direção loteados entre Exército, Marinha e Aeronáutica;
  • Quinto, manteve um general do Exército à frente do GSI – o general de divisão Gonçalves Dias, raro nome “de confiança” do presidente, assim como o loteamento entre as forças dos cargos, inclusive mantendo a equipe do antigo ministro, general Heleno.
  • Sexto, reafirmou sua disposição de investir nos projetos estratégicos da indústria de defesa e não promover alterações nos critérios de promoção de generais, nos currículos do ensino militar e nas demais áreas de autonomia autoritária dos militares.

Em contrapartida, Lula buscava o reconhecimento do resultado eleitoral, a submissão a sua autoridade negociada, o fim dos acampamentos antidemocráticos em áreas militares e a “despolitização” dos quartéis, amplamente difundida por generais e coronéis engajados na política.

Como parte desse acordo, Múcio passou a se comportar como um procurador dos comandos, fazendo a mediação de seus pontos de vista, chegando a dizer que os acampamentos golpistas seriam “manifestação da democracia”, tendo inclusive parentes que participariam[19]. Mesmo após integrantes do acampamento em frente ao Quartel General do Exército em Brasília terem promovido a depredação da sede da Polícia Federal na capital, incendiando ônibus e carros, exatamente no dia da diplomação do presidente eleito no TSE[20]; e um atentado à bomba frustrado no aeroporto da cidade[21]. Múcio sustentou uma “desmobilização natural e espontânea”, corroborando a decisão do novo comandante do Exército, general Arruda, que simulava o cumprimento de ordens judiciais com medidas “graduais” de desmobilização.

INTENTONA FASCISTA

Um dos pontos da análise anterior era justamente que todas as tendências poderiam ser impactadas por um elemento perene na política: evento inesperado. Eis que Maquiavel parece não falhar e ocorre o 8 de janeiro – um inédito atentado à sede dos três poderes da república por cerca de 4 mil pessoas mobilizadas em frente ao QG do Exército, com níveis ainda desconhecidos de participação do governo e da polícia militar do Distrito Federal (PM/DF), GSI, do ministério da defesa, do Comando da Guarda Presidencial (Exército) e do Comando Militar do Planalto (CMP) e do próprio comandante do Exército, general Arruda.

O episódio histórico, que gerou imagens impactantes de desordem e agressões violentas aos símbolos institucionais da democracia brasileira, foi acompanhado minuto a minuto por autoridades e a população através da televisão e da internet. Estavam expostos conflitos de autoridade entre o governo local e governo federal; sabotagens dentro do próprio governo federal; e entre Exército e governos local e federal.

A rápida resposta do presidente e seu ministro da justiça, com a decretação de uma intervenção federal no governo local, frustrou a recomendação do Exército, defendida pelo ministro da defesa, para decretar uma operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO’s) – excrecência autoritária da constituição de 1988 que emprega o Exército diretamente em funções de polícia para manutenção ou restabelecimento da “ordem pública”. Como percebida por Janja da Silva[22], seguir os conselhos do general Arruda seria entregar ao exército a solução de uma crise que ele mesmo foi o protagonista. As cenas do Exército tomando a esplanada seria a imagem materializada do golpe de estado mobilizado a meses nas áreas militares. Portanto, a intervenção federal frustrou o cavalo de troia da GLO.

Para confirmar a importância da intervenção federal, na noite do 8 de janeiro tropas da polícia militar já sob o comando do interventor federal foram impedidas pelo Exército de prender os executores do atentado que se refugiaram no acampamento em frente ao QG do Exército. Com tanques e efetivo de guerra, o general Arruda e o comandante do CMP bloqueavam o acesso e ameaçavam com o enfrentamento bélico[23]. Apenas na manhã seguinte, depois da evacuação coordenada pelo Exército de lideranças do ataque, a polícia militar local conseguiu realizar as prisões – ao todo, foram 1.398 pessoas presas[24].

Os desdobramentos da intentona fascista de 8 de janeiro foram muitos. No judiciário, fortaleceram medidas mais contundentes contra a participação de autoridades civis e militares com os ataques à democracia. Além de prisões de comandantes da PM/DF, do secretário de segurança local Anderson Torres – um policial federal que semanas antes era o ministro da justiça de Bolsonaro – e o afastamento temporário do governador local foram o desencadear de uma ampla reação que tem por objetivo a responsabilização do alto escalão civil e militar. No legislativo, o ataque intensificou a liderança de Lula e a base governista nos próximos meses, aumentando o custo da oposição ao governo atrelada do bolsonarismo, diretamente responsável pelo ataque do dia 8 de janeiro.

No dia seguinte, a imagem de Lula descendo a rampa de um Palácio do Planalto destruído, ladeado por autoridades dos três poderes e seguido por quase todos os governadores dos estados representou uma segunda posse, desta vez com uma demonstração inequívoca de apoio substantivo das instituições da república[25]. Se no dia primeiro de janeiro, a ausência de Bolsonaro possibilitou outra imagem histórica de símbolos do povo entregarem a faixa presidencial, desta vez Lula recebia a faixa hegemônica do poder político nacional. Aliada à opinião pública de amplo repúdio aos ataques e às medidas repressivas e investigatórias, Lula e o governo saíram muito fortalecidos – ainda que temporariamente.

Foi esse cenário de amplo apoio que abriu uma “janela de oportunidade” para que o presidente eleito finalmente fosse empossado como “comandante-em-chefe” das forças armadas. Com as evidências claras de participação do Exército no ataque do dia 8, Lula passou a criticar abertamente as Forças Armadas, revelando a “perda de confiança” nos comandantes. Ao mesmo tempo que resistiu a demitir os ministros da defesa e do GSI, cobrou providências de generais para responsabilizarem militares e acenou com uma “virada de página” em reunião com empresários para promoção da indústria de defesa.

Depois da tentativa frustrada de golpe, o Alto Comando do Exército (ACE) já havia combinado uma mudança de discurso, visando “virar a página” das eleições, reconhecendo seu resultado e aceitando a autoridade do presidente eleito. Com a imagem abalada depois de seis anos de crescente partidarização – o Exército é menos confiável que o governo ou as polícias militares[26] – a “submersão” nos postos tradicionais da tutela militar trariam a “volta da normalidade”.

Porém, o intra-muros foi divulgado por um dos então cotados para assumir o comando do Exército, general Tomás Paiva. Em discurso para a tropa do Comando Militar do Leste, Paiva fez uma defesa enfática da despolitização das forças armadas e da obediência ao resultado eleitoral, assim como o comando do presidente eleito. Foi o suficiente para em poucos dias ser nomeado o novo comandante do Exército, após demissão do general Arruda que resistia em tomar medidas concretas para afastar militares orgânicos do bolsonarismo[27]. Agora, a volta da “normalidade” das relações entre governo e forças armadas seria respeitar as áreas de autonomia autoritária, recebendo em troca a não partidarização.

CONCLUSÃO

Uma vez eleito, Lula e sua frente ampla democrática vislumbravam três “grandes batalhas” para garantir uma posse com condições razoáveis de governabilidade. A primeira, era o congresso, formando uma maioria parlamentar nas duas casas a partir da composição de ministérios e ocupação de cargos estratégicos, assim como a eleição das presidências para os próximos dois anos. Esta foi vencida com êxito, inclusive com a aprovação de uma ampliação do orçamento para implementação das principais medidas econômicas.

A segunda estava na econômica, considerado o principal desafio, pois é a grande urgência social e política de um país empobrecido e a pedra fundamental para se prevenir de uma tentativa de golpe. Tanto na montagem de seu ministério na área econômica, como na definição da política econômica, tratava-se de enfrentar uma campanha aberta do “mercado” para manter a política neoliberal do governo militarizado, em oposição à “heterodoxia” da política desenvolvimentista defendida pelo governo. É outra batalha que foi bem-sucedida, ao menos inicialmente, com a nomeação de Fernando Haddad (PT) como ministro da fazenda, Simone Tebet (MDB) para o planejamento e nomes próximos em empresas e bancos estatais.

A terceira seria os militares, principal grupo de oposição dentro do próprio estado e com significativa capilaridade social e cultural. Ao que tudo indica, há uma compreensão da média do generalato que é preciso recolher a exposição política das forças armadas. Espaços estratégicos foram conquistados, benesses implementadas, basta conservar. Na política, a tendência de retorno à normalidade já foi dada pelo ex-ministro da defesa, atual senador e líder do governo, Jacques Wagner. Para ele, militares são uma fração da classe média vítimas de uma “lavagem cerebral” operada pela operação Lava Jato. Inclusive Villas-Bôas teria apenas cometido um ato “fora da curva” do comportamento democrático e profissional exemplar[28]. Significa manter as zonas de autonomia dos militares dentro do estado brasileiro, como um “partido do estado”[29]. Um bom exemplo disso foi apenas a reformulação dos cargos do GSI loteados entre Exército, Marinha e Aeronáutica: saem generais ligados a Heleno, entram generais ligados a Villas-Boas[30]. O outro lado da moeda promete responsabilização para os militares que participaram da intentona fascista. E tenta efetivar a desmilitarização da Agência Brasileira de Inteligência (ABI), com a transferência para a Casa Civil, órgão tradicionalmente civil, mas ultimamente militarizado[31].

Mas, para além da “normalidade” autoritária de tutela militar, teremos uma normalidade democrática da relação entre a burocracia armada e o poder político sujeito à soberania popular? Teremos uma mudança estruturante nas forças armadas brasileiras? Seria prudente observar que neste ano junho de 2013 completa uma década sem ver suas causas enfrentadas de maneira estrutural. É que se a posse de Lula significou uma mudança de rota, ainda pende de ser na direção de mudanças estruturais nas forças armadas[32].

Finalmente, que essas mudanças estruturantes estão ligadas aos conflitos distributivos produzidos pelo neoliberalismo e a ressignificação da participação popular no sistema político. Um desenvolvimento econômico sem mudanças pode a ser rapidamente dragado por uma nova e definitiva crise política. Outra vez mais, a inteligência de classe na relação entre governo e organização popular será o fio da balança para produzir um assenso vertical nesse estágio de luta de classes no Brasil.


Leia o texto em alemão
Brasiliens Militär und die Wahlen


[1] Professor de ciência política da Universidade de Brasília, pesquisador do Observatório sobre Defesa e Soberania do Instituto Tricontinental e autor do livro “República de Segurança Nacional: militares e política no Brasil” (2022).

[2] https://www.poder360.com.br/eleicoes/lula-teve-maior-votacao-da-historia-e-bateu-proprio-recorde/

[3] No Brasil a corte eleitoral existe a 90 anos, é composta por 3 ministros do STF, 2 do STJ (Superior Tribunal Justiça) e 2 advogados indicados pelo STF e nomeados pelo presidente da república.

[4] https://g1.globo.com/politica/blog/valdo-cruz/post/2022/08/08/tse-exclui-de-grupo-de-fiscalizacao-coronel-que-divulga-fake-news-sobre-urnas.ghtml

[5] https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2023/01/5068033-perfil-combativo-torna-alexandre-de-moraes-uma-peca-chave-no-supremo.html

[6] https://www.poder360.com.br/governo/governo-gastara-r-200-bi-com-beneficios-em-ano-eleitoral/

[7] https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2023/02/14/consignado-auxilio-brasil-suspeita-uso-eleitoral-caixa-favorecer-bolsonaro.htm?cmpid=copiaecola

[8] https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/08/forcas-armadas-mudam-as-pressas-desfile-militar-no-rio-por-ordem-de-bolsonaro.shtml

[9] https://thetricontinental.org/pt-pt/brasil/boletim-especial-militares-e-eleicoes-2022-no-brasil/

[10] https://www.cartacapital.com.br/politica/democrata-indomavel/

[11]  https://g1.globo.com/politica/eleicoes/2022/noticia/2022/10/30/nordeste-concentrou-quase-metade-das-abordagens-feitas-a-onibus-pela-prf-no-2oturno.ghtml

[12] https://www.metropoles.com/colunas/rodrigo-rangel/exclusivo-comite-de-jair-bolsonaro-em-brasilia-vira-qg-do-golpe

[13]https://www.cnnbrasil.com.br/politica/equipe-de-transicao-tem-veto-ao-gsi-e-expulsao-de-infiltrados/

[14] https://www.estadao.com.br/politica/relatorio-forcas-armadas-urnas-ministro-defesa-eleicoes-codigo-malicioso-tse-provas-fraude/

[15] https://g1.globo.com/politica/noticia/2022/11/11/forcas-armadas-divulgam-nota-condenando-eventuais-excessos-cometidos-em-manifestacoes.ghtml 

[16] https://noticias.uol.com.br/colunas/chico-alves/2022/11/19/general-da-10-regiao-militar-protege-manifestantes-e-desafia-judiciario.htm

[17] https://www.poder360.com.br/governo/exercito-e-marinha-resistem-a-antecipar-troca-de-comandantes/

[18] https://www.poder360.com.br/governo/bem-visto-pelas-forcas-armadas-diz-mourao-sobre-mucio/

[19] https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2023/01/02/mucio-diz-que-tinha-amigos-em-acampamento-e-manifestacao-democratica.htm

[20] https://g1.globo.com/df/distrito-federal/noticia/2022/12/13/como-foram-os-atos-de-bolsonaristas-radicais.ghtml

[21] https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2023/02/16/interna_politica,1458191/preso-por-atentado-a-bomba-em-brasilia-escreveu-carta-para-bolsonaro.shtml

[22] https://www.metropoles.com/colunas/guilherme-amado/a-reacao-de-janja-quando-jose-mucio-propos-que-lula-baixasse-glo

[23] https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2023/01/23/interna_politica,1447986/ex-comandante-do-exercito-ameacou-chefe-da-pm-do-df-tenho-mais-tropa.shtml

[24] https://www.poder360.com.br/justica/916-dos-1-398-extremistas-do-8-de-janeiro-seguem-presos-no-df/

[25] https://g1.globo.com/politica/noticia/2023/01/09/apos-reuniao-lula-e-governadores-fazem-caminhada-simbolica-ao-stf.ghtml

[26] https://cdn.atlasintel.org/15a583c1-854b-4a49-b8ba-a65ea9f104de.pdf

[27] https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2023/01/21/lula-exonera-o-comandante-do-exercito-arruda.htm

[28] https://www1.folha.uol.com.br/poder/2023/02/lavagem-cerebral-da-lava-jato-alimentou-resistencia-a-lula-entre-militares-diz-jaques-wagner.shtml

[29] https://www.ihu.unisinos.br/611312-o-projeto-de-poder-do-partido-militar-e-os-riscos-da-militarizacao-da-vida-entrevista-especial-com-ana-penido-e-suzeley-mathias

[30]  https://www.poder360.com.br/governo/governo-troca-numero-2-do-gsi-apos-sugestao-do-exercito/

[31] https://www.estadao.com.br/politica/coluna-do-estadao/transferencia-da-abin-para-a-casa-civil-sera-feita-por-decreto/

[32] https://thetricontinental.org/pt-pt/brasil/passado-presente-e-futuro-em-20-pontos-como-prosseguir-no-enfrentamento-a-tutela-militar/