Relatório do evento online em 4 de outubro de 2022.
Dois dias após o primeiro turno das eleições presidenciais no Brasil, a Fundação Rosa Luxemburgo Bruxelas, em cooperação com a Fundação Rosa Luxemburgo Brasil, organizou o evento online Brasil após as eleições. A atividade contou com a participação do ex-ministro das Relações Exteriores e integrante do Partido dos Trabalhadores (PT), Celso Amorim; da professora e coordenadora do Mestrado Profissional em Governança Global e Formulação de Políticas Internacionais da PUC-SP ; e do integrante do grupo da esquerda no Parlamento Europeu (THE LEFT), Helmut Scholz.
No primeiro turno, o candidato de esquerda Luiz Inácio Lula da Silva ficou à frente com 48%, como previsto pelas pesquisas. Ainda chama atenção o resultado do titular de extrema-direita Bolsonaro (43%), percentual que não era esperado nessa escala.
O segundo turno será realizado em 30 de outubro de 2022, mas, independentemente do resultado desta disputa, a extrema-direita saiu fortalecida nas eleições parlamentares (governamentais e legislativas), portanto, continuará muito presente no Brasil nos próximos anos.
POLARIZAÇÃO DO ELEITORADO
Celso Amorim (PT) destacou que os últimos anos, sob o governo do presidente de extrema-direita Jair Bolsonaro, foram momentos de violência, o que levou à polarização no eleitorado. Paralelamente, a direita obteve agora ganhos nas eleições parlamentares e continuará a exercer sua influência nos próximos anos. A crise do capitalismo e do neoliberalismo levou à polarização entre o eleitorado, inclusive no campo da direita.
Segundo Amorim, se Lula vencer as eleições, ele se dedicará cada vez mais às questões de proteção climática, política comercial, desenvolvimento sustentável e integração sul-americana. Em 1994, a política comercial ainda estava sob o título de “livre comércio”, mas hoje o foco deve ser o respeito aos direitos humanos e a proteção do clima – isto, no entanto, não deve levar ao protecionismo. Lula vê o Brasil como um país ponte entre a América do Sul e a África e, por isso, é importante que as negociações sobre o acordo de livre comércio UE-Mercosul sejam retomadas.
Neste contexto, enfatizou o ex-ministro, é crucial que o Brasil possa se desenvolver e criar um espaço político para a política industrial. Isto porque, o Brasil não deveria se tornar “o celeiro” da UE ou da China, mas manter e expandir sua própria base industrial. Por exemplo, o Brasil deve ter mais flexibilidade no uso de patentes para promover o desenvolvimento industrial independente.
ECONOMIA DE BAIXO CARBONO
Terra Budini enfatizou a importância do Brasil fazer a transição para uma economia de baixo carbono, que seja verdadeiramente baseada na sustentabilidade. Ela avaliou que o acordo comercial UE-Mercosul está embutido nos crescentes conflitos atuais de apropriação de terras dos povos indígenas, limitação dos direitos indígenas, exploração da Amazônia e aumento das emissões de gases de efeito estufa. Ao mesmo tempo, temos visto um crescimento significativo do setor informal, empregos precários e uma geração de desempregados crescendo.
A professora destacou que o acordo de livre comércio UE-Mercosul não é realmente conhecido pelo público em geral no Brasil. Desde 2016, houve uma exclusão dos parceiros sociais, como os sindicatos, do debate, de modo que quase não há acesso à informação. Se Lula vencer as eleições presidenciais, ele trabalhará para abrir as negociações para a sociedade civil e criar transparência suficiente.
SEGURANÇA ALIMENTAR E ENERGÉTICA
Helmut Scholz (DIE LINKE) falou sobre a importância de se estabelecer critérios de sustentabilidade e padrões sociais no centro dos acordos comerciais. O texto atual do acordo de livre comércio UE-Mercosul não é novo, mas resultado de um processo de negociação de 20 anos e precisa ser renegociado urgentemente. A segurança alimentar e a segurança energética são as tarefas centrais do futuro, e as relações de comércio justo são ainda mais importantes para que as cadeias de valor internacionais não sejam destruídas.
No texto atual, avalia Scholz, não há arbitragem para questões de proteção climática – isto deve ser mudado urgentemente. As tarifas para o setor têxtil e a indústria automotiva também devem ser reduzidas em até 35%: isto representa um grande problema para a América do Sul, pois ameaça desindustrializar regiões amplas.
O refinamento do lítio minado para a produção de baterias para carros elétricos também teria que acontecer localmente para gerar empregos localmente. Portanto, Lula já havia anunciado que iria reescrever o texto de negociação para conseguir melhorias e uma reindustrialização dos países do Mercosul. O grupo de esquerda do Parlamento Europeu defenderá esta posição e pressionará a Comissão Europeia a causar uma abertura no texto do Tratado.