Apenas junto com as mulheres proletárias o socialismo será vitorioso

05/07/2020
por
Clara Zetkin

Clara Zetkin

16 de Outubro de 1896

As pesquisas de Bachofen, Morgan e outros parecem comprovar que a repressão social das mulheres coincide com a criação da propriedade privada. O antagonismo na família entre o marido como proprietário e a mulher como não proprietária se tornou a base da dependência econômica e da falta de direitos sociais do sexo feminino. De acordo com Engels, trata-se de uma das primeiras e mais antigas formas da exploração de classes. Ele afirma: “Na família, o marido representa a burguesia e a esposa, o proletariado”.

No entanto, não havia uma questão das mulheres no sentido moderno da palavra. Foi apenas o modo de produção capitalista, que provocou transformação societal e levantou a moderna questão das mulheres, destruindo o antigo sistema econômico e familiar que provinha, durante o período pré-capitalista, meios de subsistência e sentido de vida para a grande massa de mulheres. Nós não devemos, entretanto, transferir às antigas atividades econômicas femininas conceitos (como futilidade e mesquinhez) que são ligados às atividades femininas de nosso tempo. Quando o antigo tipo de família existia, a mulher encontrava nas atividades produtivas um sentido de vida, mesmo que não tivesse consciência de sua falta de direitos e que o fosse limitado o desenvolvimento de seus potenciais como indivíduo.

O período do Renascimento foi tempestuoso e estressante no despertar de uma individualidade moderna capaz de se desenvolver plenamente nas mais diversas direções. Encontramos indivíduos que eram gigantes, para o bem e para o mal, que rejeitam os mandamentos das religiões, das concepções morais e desprezam igualmente céu e inferno. Nós descobrimos mulheres no centro da vida social, artística e política. E, ainda, não existia um traço de movimento das mulheres. Esta é a maior razão para o antigo sistema começar a ruir sob o impacto da divisão do trabalho. Milhares e milhares de mulheres não mais encontravam sentido na vida no interior da família, mas essa questão, de acordo com o que podemos analisar, foi resolvida na época com conventos, instituições de caridade e ordens religiosas.

As máquinas, o modo moderno de produção, lentamente acabaram com a produção doméstica não apenas para milhares, mas para milhões de mulheres a pergunta era: onde encontraremos nosso meio de vida? onde nós encontraremos um sentido de vida assim como um trabalho que nos dê satisfação mental? Milhões estavam agora forçadas a encontrar seu meio e sentido de vida fora de suas famílias e na sociedade como um todo. Nesse momento, elas se tornaram conscientes do fato de que sua ausência de direitos sociais esteve em oposição com a maioria de seus interesses básicos. A partir deste momento surgiram as modernas questões das mulheres. Aqui estão algumas estatísticas que mostram como o modo de produção moderno tornou a questão das mulheres ainda mais aguda. Durante 1882, 5,5 milhões das 23 milhões de mulheres na Alemanha estavam totalmente desempregadas, um quarto da população feminina não encontrava mais seu sustento na família. De acordo com o censo de 1895, o número de mulheres empregadas na agricultura, no sentido mais amplo desse termo, havia crescido mais de 8% desde 1882 e no sentido estrito cerca de 6%, enquanto o número de homens empregados na agricultura decrescia algo entre 3% e 11%, por ano. Na área das indústrias e das minas, o número de empregadas cresceu cerca de 35% e o de homens cerca de 28%. No mercado de tecelagem, o número de mulheres empregadas cresceu mais de 94% e o de homens apenas 38%. Apenas esses números revelam muito mais da urgência em se resolver as questões das mulheres do que uma declamação inflamada.

A questão das mulheres, entretanto, está presente apenas entre aquelas classes da sociedade que são elas próprias produtos do modo capitalista de produção. Então, não encontraremos tais problemas nos círculos camponeses, onde existe a economia natural (embora reduzida e abalada). Mas nós certamente os encontraremos naquelas classes da sociedade em que todas as crianças participam do modo moderno de produção. Existe uma questão das mulheres para cada integrante do proletariado, da burguesia, da intelectualidade etc. e uma forma diferente é assumida de acordo com a situação de classe de cada uma.

Como se entende uma questão da mulher na alta sociedade? Graças às suas propriedades, estas mulheres podem desenvolver sua individualidade e viver como desejam. Em toda sua vida, entretanto, ainda dependem de seu marido. A guarda sobre o sexo mais frágil sobrevive na lei da família que afirma: “Ele deverá ser seu mestre”. E como é constituída a família da alta sociedade para que a mulher seja legalmente subjugada pelo marido? Em seus primórdios, não seguiam pré-requisitos morais. Não era a individualidade, mas o dinheiro que decidia sobre o matrimônio. Seu mote é: o que o capital une, a moralidade sentimental não deve separar. Então, nessa forma de casamento, duas prostituições são tomadas como uma virtude. A eventual vida em família se desenvolve de acordo com os mesmos termos. Onde quer que a mulher não seja mais forçada a realizar seus deveres, ela transfere seus deveres de mulher, mãe e dona de casa para serviçais pagos. Se as mulheres destes círculos têm o desejo de dar a suas vidas um propósito sério, elas devem, primeiramente, aumentar a possibilidade de dispor de suas propriedades de forma independente e livre. Esta demanda representa o centro das demandas apresentadas pelo movimento das mulheres da alta sociedade. Estas mulheres, em sua luta pela realização de suas demandas contra o mundo masculino de suas classes, travam exatamente a mesma batalha que a burguesia lutou contra as classes privilegiadas, ou seja, uma batalha para remover todas as diferenças sociais baseadas nas posses das propriedades.

O fato de que esta demanda não lida com os direitos dos indivíduos está provado pela defesa de Herr Von Stumm no Reichstag. Mas quando ele defendeu os direitos de uma pessoa? Este homem, na Alemanha, significa mais do que uma personalidade, ele é o capital em carne e osso. E se este homem se apresenta com uma máscara barata pelos direitos das mulheres, então isso só aconteceu porque ele foi forçado a dançar diante da Arca da Aliança do capitalismo. Este é Herr Von Stumm, que sempre está pronto para colocar um basta para seus trabalhadores se eles não dançarem conforme sua música e certamente apresentaria um sorriso satisfeito se o Estado, como empregador, colocasse os professores e intelectuais que insistem em discutir políticas públicas sob suas rédeas também. Os esforços de Herr Von Stumm não almejam nada além de requerer para a mulher a posse dos bens no caso de herança feminina, uma vez que existem pais que mantêm posses, mas não foram cuidadosos na definição de suas crianças, deixando apenas as filhas como herdeiras. Assim, o capitalismo honra a poucas mulheres, permitindo que elas possam dispor de suas fortunas. Esta é a fase final da emancipação da propriedade privada.

Como se apresentam as questões das mulheres nos círculos da pequena burguesia, da classe média e da burguesia intelectual? Nesse caso, não é a propriedade que dissolve a família, mas principalmente os sintomas concomitantes da produção capitalista. Neste nível, a produção completa sua marcha triunfal, a classe média e a pequena burguesia estão cada vez mais a caminho de sua destruição. Entre a burguesia intelectual, outra circunstância leva a piora das condições de vida: o capitalismo precisa de força de trabalho inteligente e treinada cientificamente. Isso então favoreceu uma superprodução de proletários de trabalho intelectual e contribuiu para o fenômeno de que as posições sociais antigamente respeitadas e lucrativas de membros da classe profissional estejam se erodindo.

O número de casamentos, porém, está caindo nesse segmento; mesmo com bases materiais piores, o aumento da expectativa de vida dos indivíduos faz com os homens pensem duas ou três vezes antes de entrar em um casamento. A idade limite para se formar uma família aumentou e o homem não sofre pressão para se casar, pois em nosso tempo existem bastantes instituições sociais que oferecem uma vida confortável a um velho bacharel sem uma esposa legítima. A exploração capitalista da força de trabalho proletário por meio de salários de fome acaba gerando uma grande oferta de prostitutas que correspondem às demandas desses homens. Então, dentro dos círculos da burguesia o número de mulheres solteiras sempre cresce.

As mulheres e filhas destes círculos são jogadas na sociedade e precisam se estabelecer por si próprias de forma que obtenham não apenas seus meios de subsistência – ou seja, não apenas o pão –, mas também garantam sua saúde mental. Neste segmento, as mulheres não são iguais aos homens em relação às posses das propriedades privadas, como nas camadas superiores. Estas mulheres ainda precisam garantir sua igualdade econômica com os homens e podem conseguir isso a partir de duas reivindicações: a reivindicação por treinamento profissional igualitário e a reivindicação por oportunidades iguais de trabalho para ambos os sexos. Em termos econômicos, isto significa nada menos do que a realização do livre acesso a todos os empregos e a competição igualitária entre homens e mulheres. A realização disso desencadeia um conflito entre homens e mulheres no seio da burguesia e da intelectualidade. A competitividade das mulheres no mercado de trabalho é a força que move a resistência dos homens contra as demandas de quem advoga pelos direitos das mulheres burguesas. Pura e simplesmente medo da competição. Todas as outras razões que são listadas contra o trabalho feminino qualificado, como o cérebro das mulheres ser menor e uma tendência natural a serem mães são apenas pretextos. Esta batalha coloca as mulheres deste estrato social diante da necessidade de exigir seus direitos políticos, lutando politicamente, derrubando todas as barreiras que foram criadas contra a sua atividade econômica.

Até então, me posicionei apenas diante da estrutura política básica e pura. Nós iremos, entretanto, cometer uma injustiça contra o movimento burguês pelos direitos das mulheres se nós atribuíssemos apenas motivações econômicas. Não, este movimento também contém um aspecto mais profundo. As mulheres da burguesia exigem não só seu sustento, mas também querem poder desenvolver sua individualidade. Exatamente junto a esse segmento encontramos esta trágica, porém psicologicamente interessante figura “Nora”, mulheres que estão cansadas de viver como bonecas, em casas de bonecas e que querem compartilhar do desenvolvimento da cultura moderna. A economia, bem como a intelectualidade empreendida pelos defensores dos direitos das mulheres da burguesia, são completamente justificáveis.

No que diz respeito às proletárias, foi a necessidade do capitalismo de explorar e buscar incessantemente por uma força de trabalho barata que criou tal questão das mulheres. Essa também é a razão pela qual o proletariado feminino se tornou parte do mecanismo da vida econômica de nosso período e foi para as oficinas e para as máquinas. Elas saíram para a vida econômica para ajudar seus maridos na subsistência, mas o sistema capitalista as transformou em injustas competidoras. Elas buscavam prosperidade para a família, entretanto, encontraram a miséria. As mulheres proletárias se empregaram porque queriam construir uma vida feliz e prazerosa para seus filhos, mas se viram totalmente apartadas deles. Elas se igualaram aos homens como trabalhadores; as máquinas proporcionavam as forças supérfluas e em qualquer ramo o trabalho das mulheres passou a apresentar o mesmo resultado que o dos homens. E como as mulheres constituem uma força de trabalho barata e acima de tudo submissas, tanto que em apenas raros casos ousaram chutar os espinhos da exploração do capitalismo, os capitalistas aumentaram as possibilidades de trabalho das mulheres na indústria. Como resultado, as proletárias alcançaram sua independência. Mas, na realidade, o preço pago foi muito alto e elas ganharam muito pouco. Se durante a Era da Família, o homem tinha o direito (pense na lei eleitoral da Bavária!) de domar sua mulher com um chicote, o capitalismo está, agora, domando-a ainda mais. Antigamente, o controle de um homem sobre sua mulher era amenizado pela relação pessoal entre eles. Já entre um empregador e um empregado, entretanto, existe apenas o vínculo financeiro. O proletariado feminino ganhou sua independência, mas nem como ser humano, nem como mulheres ou esposas, elas têm a possibilidade de desenvolver sua individualidade. Para suas tarefas como esposa e mãe, restam apenas as migalhas que a produção capitalista deixa cair da mesa.

As lutas pela libertação das mulheres proletárias não podem ser comparadas às lutas que as mulheres da burguesia travam contra os homens de sua classe. Pelo contrário, elas devem empreender uma luta unitária com os homens de sua classe contra toda a classe capitalista. Elas não precisam lutar contra os homens de sua classe para derrubar as barreiras que foram erguidas contra sua participação no mercado da livre competição. A necessidade do capitalismo de explorar e desenvolver o modo moderno de produção as libera totalmente de travarem tal briga. Ao contrário, novas barreiras precisam ser erguidas contra a exploração do proletariado feminino. Seus direitos como esposa e mãe precisam ser restaurados e garantidos permanentemente. Seu clamor final não é a livre competição com os homens, mas o poder político nas mãos do proletariado. As mulheres operárias lutam lado a lado com os homens de sua classe contra a sociedade capitalista. Para se ter certeza, elas também concordam com as demandas do movimento feminino burguês, mas elas sabem que a simples realização dessas demandas é uma forma de impedir que o movimento entre na batalha, equipado com as mesmas armas, ao lado de todo o proletariado.

A sociedade burguesa não é fundamentalmente contra o movimento burguês das mulheres, o que pode ser provado pelo fato de que em vários estados foram iniciadas reformas das leis, em âmbito público e privado. Existem duas razões pelas quais a implementação dessas reformas parece demorar excepcionalmente na Alemanha: primeiramente, os homens temem a competição nas profissões liberais e precisa-se levar em consideração que o desenvolvimento da democracia burguesa é bastante lento e fraco na Alemanha, que não acompanha sua tarefa histórica porque sua classe dominante teme o proletariado. Temem que estas reformas só trarão vantagens para os sociais-democratas. Quanto menos a democracia burguesa se deixar levar pelo medo, mais estará preparada para realizar tais reformas. A Inglaterra é um bom exemplo. A Inglaterra é o único país que ainda tem uma burguesia verdadeiramente poderosa, enquanto a burguesia alemã, tremendo de medo do proletariado, se intimida em realizar reformas políticas e sociais. Assim como está a Alemanha, existe o fator adicional de visão Filistina ampla. A noção Filistina de prejuízo atinge profundamente a burguesia alemã. Para se ter certeza, este medo da burguesia alemã é muito raso. Garantir igualdade política para homens e mulheres não muda o atual balanço de forças. As mulheres proletárias acabam no proletariado e as da burguesia acabam no campo da burguesia. Não podemos nos deixar enganar pelas tendências socialistas no movimento burguês de mulheres, que só persistirão enquanto as mulheres burguesas se sentirem oprimida.

Quanto menos a democracia burguesa entende sua tarefa, mais importante é para a social-democracia defender a igualdade política das mulheres. Não queremos parecer melhores do que somos. Não estamos fazendo essa demanda em nome de um princípio sagrado, mas no interesse da classe operária. Quanto mais o trabalho feminino exerce influência negativa na vida dos homens, mais urgente se tornará a necessidade de incluí-las na batalha econômica. Quanto mais a batalha política afetar a existência de cada indivíduo, mais urgente será a participação das mulheres nessa luta. Foi a lei antissocialista que deixou claro para as mulheres o que significava justiça de classe, Estado de classe e leis de classe. Foi esta lei que ensinou às mulheres a necessidade de aprender sobre a força que intervém tão brutalmente em suas famílias. A lei antissocialista cumpriu com sucesso seu trabalho que não teria sido realizado por uma centena de agitadoras e, portanto, somos profundamente gratas a essa lei que como todos os órgãos do governo (do ministério à polícia local) que participaram e contribuíram maravilhosamente com esses serviços involuntários de propaganda. Então, como podem acusar a nós, sociais-democratas, de ingratidão? (risos).

Ainda existe outro evento que deve ser levado em consideração. Estou me referindo à publicação de Augusto Bebel, o livro Mulheres e o socialismo. Este livro não deve ser julgado de acordo com seus aspectos positivos ou pelos seus atalhos. Deve ser julgado pelo contexto de quando foi escrito. Foi mais do que um livro, foi um evento – um maravilhoso tratado (bastante preciso). O livro apontou pela primeira vez a conexão entre a questão feminina e o desenvolvimento histórico. Pela primeira vez, deste livro soou um apelo: nós apenas conquistaremos o futuro se persuadirmos as mulheres a se tornarem co-lutadoras. Reconhecendo isso, não estou falando apenas como mulher, mas como uma camarada do partido.
Quais conclusões práticas nós podemos esboçar para nossa propaganda junto às mulheres? A tarefa deste congresso do partido não deve se resumir a sugestões de detalhes práticos, mas sim a delinear diretrizes gerais para o movimento de mulheres.

Nossa linha de pensamento deve ser: não devemos conduzir propaganda especial para as mulheres, mas fazer agitação socialista entre as mulheres. Os tacanhos e momentâneos interesses do mundo feminino não podem ser permitidos nesse estágio. Nossa tarefa deve ser incorporar as trabalhadoras modernas na nossa luta de classes! Não temos tarefas especiais para a agitação junto às mulheres. Essas reformas para as mulheres que devem ser realizadas no âmbito da sociedade de hoje já são exigidas dentro do programa mínimo de nosso partido.

A propaganda das mulheres deve tocar naquelas questões que são de grande importância para todo o movimento operário. A principal tarefa, portanto, deve ser despertar a consciência de classe das mulheres e incorporá-las à luta de classes vigente. A sindicalização das trabalhadoras é extremamente difícil. Durante os anos de 1892 a 1895, o número de trabalhadoras organizadas em centrais sindicais cresceu para cerca de 7.000. Se adicionarmos a esse número as trabalhadoras organizadas em sindicatos locais e enxergarmos que ao menos 700.000 mulheres estão envolvidas ativamente nas grandes indústrias, então começaremos a entender o tamanho do trabalho de organização que está adiante. Nosso trabalho se torna mais difícil pelo fato de que muitas mulheres estão ativas na indústria doméstica e há muita dificuldade em organizá-las. Também temos que lidar com a difundida crença entre as garotas jovens que seu trabalho industrial é apenas transitório e que terminará quando se casarem. Para muitas mulheres existe a dupla obrigação de ser ativa tanto na fábrica quanto em casa. O que é mais necessário para as trabalhadoras é obter uma jornada de trabalho legalmente fixada. Enquanto na Inglaterra todos concordam que a eliminação da indústria doméstica, o estabelecimento de uma jornada de trabalho legal e o pagamento de salários mais altos são importantes requisitos para a sindicalização das trabalhadoras – na Alemanha, além desses obstáculos, enfrentamos também a obrigação da sindicalização e das assembleias. A liberdade plena de formar coalizões, que era garantida pela lei do Império, foi ilusoriamente retida pelas leis de cada estado federativo. Não quero discutir como tal direito de formar um sindicato é tratado na Saxônia (mesmo que alguém possa falar de um direito lá). Mas em dois dos maiores estados federativos, a Bavária e a Prússia, as leis sindicais são tratadas de tal maneira que a participação feminina nos sindicatos tem se tornado cada vez mais impossível. Mais recentemente na Prússia, o distrito do “liberal”, o eterno candidato a ministro, Herr Von Bennigsen, tem conseguido tudo humanamente possível na interpretação da Lei da Sindicalização e das Assembleias. Na Bavária todas as mulheres são excluídas de reuniões públicas. Na Câmara de lá, Herr Von Freilitzsch declarou muito abertamente que ao lidar com a lei da sindicalização, não apenas o texto, mas também a intenção do legislador deve ser levada em consideração. Herr Von Freilitzsch está na melhor posição para saber exatamente as intenções dos legisladores, todos eles acabaram de morrer, antes deixando a Bavária com mais sorte do que qualquer um pudesse imaginar nos seus melhores sonhos, nomeando Herr Von Freilitzsch como ministro da polícia. Isso não me surpreende, quem recebe um ofício de Deus também recebe a inteligência correspondente, e em nossa Era do Espiritualismo, Herr Von Freilitzsch obteve tanto sua inteligência oficial, como por meio da quarta dimensão, descobriu as intenções dos falecidos legisladores (risos.)

Esta situação, portanto, não abre possibilidade para que as trabalhadoras se organizem junto aos homens. Até agora, elas enfrentaram uma luta contra o poder policial e estratagemas jurídicos e, à primeira vista, parecem ter sido derrotadas. Na realidade, entretanto, elas se tornaram vitoriosas porque todas as medidas usadas para esmagar a organização das trabalhadoras só serviram para despertar sua consciência de classe. Se quisermos ter uma poderosa organização de mulheres, tanto no aspecto econômico como político, devemos então, primeiramente, cuidar da possibilidade de um movimento feminino livre, lutando contra a indústria doméstica, por jornadas de trabalho menores e, acima de tudo, contra o conceito de organização da classe dominante.

Não podemos determinar, neste congresso do Partido, qual forma nossa propaganda entre as mulheres deve tomar. Devemos, primeiramente, aprender como faremos nosso trabalho junto às mulheres. Na resolução que vos foi apresentada, propõe-se para eleger delegadas sindicais, cuja tarefa será a de estimular a união e organização econômica das mulheres e para consolidá-la de maneira uniforme e planejado. Esta proposta não é nova; foi adotada em princípio pelo Congresso do Partido de Frankfurt, e em algumas regiões foi implantada com sucesso. O tempo irá dizer se essa proposta, quando aplicada em maior escala, é adequada para colocar as mulheres em maior medida no movimento proletário.

Nossa propaganda não deve ser realizada apenas de maneira falada. Um grande número de pessoas passivas não está em nossas reuniões e incontáveis esposas e mães não podem vir. Na verdade, não deve ser tarefa da propaganda socialista alienar a mulher trabalhadora de seus deveres como mãe e esposa. Ao contrário, ela deve ser encorajada a realizar suas tarefas melhor que nunca no interesse da libertação do proletariado. Quanto melhores as condições de sua família, quanto mais eficiente for em casa, maior será sua capacidade de lutar. Quanto mais ela for modelo e educadora de seus filhos, mais apta estará para iluminá-los para que eles continuem na luta, que mantenham o mesmo entusiasmo e vontade de sacrificar-se pela libertação do proletariado. Quando um trabalhador disse: “Minha esposa!”, ela pensará “camarada de meus ideais, companheira em minhas batalhas e mãe dos meus filhos, para as futuras batalhas”. Muitas mães e esposas que despertam a consciência de classe em seus maridos e filhos fazem tanto quanto as camaradas que nós vemos em nossas reuniões.

Se a montanha não vai a Maomé, Maomé deve ir à montanha: nós devemos levar o socialismo para as mulheres através de uma propaganda escrita planejada. Para tal campanha, eu sugiro a distribuição de panfletos e eu não quero dizer do tradicional panfleto no qual todo o programa socialista e todo o conhecimento científico do século estão condensados em um quarto de página. Não, nós devemos usar pequenos panfletos nos quais se discuta um problema prático de um ponto de vista, principalmente aquele da luta de classes, que é a tarefa principal. E não devemos assumir uma atitude indiferente para a produção técnica de panfletos. Não devemos usar, como é nossa tradição, o pior papel e o pior tipo de impressão. Tal panfleto miserável será amassado e jogado fora pelas trabalhadoras que não tem o mesmo respeito pela palavra impressa do que os trabalhadores. Devemos imitar os norte americanos e ingleses que faziam pequenos livretos de quatro a seis páginas. Pois mesmo uma trabalhadora é mulher suficiente para dizer para si mesma: “Isso é mesmo encantador. Terei que pegá-lo e mantê-lo”. As frases que realmente importam devem ser impressas em letras grandes. Então as trabalhadoras não ficarão com medo de ler e sua atenção será estimulada.

Por causa de minhas experiências pessoais, não posso defender a fundação de um jornal especial para as mulheres. Minha experiência não é baseada na minha posição como editora do Gleichheit (que não é destinado à massa feminina, mas à sua vanguarda progressista), mas como distribuidora de literatura entre as trabalhadoras. Estimulada pelas ações de Frau Gnauck-Kuhne, eu distribuí jornais por semanas em certa fábrica. Eu me convenci que as mulheres lá não só não aprenderam com aquele jornal o que era esclarecedor, mas o que era engraçado e de entretenimento. Dessa forma, os sacrifícios de se publicar um jornal barato não valeriam a pena.
Também criamos uma série de brochuras que levavam o socialismo para mais próximo das mulheres como trabalhadoras, esposas e mães. Exceto pela poderosa brochura de Frau Popp, não tivemos uma só que chegou ao número de pedidos que precisávamos. Nossa imprensa diária, também, precisa realizar mais do que fez até então. Alguns jornais diários tiveram a intenção de esclarecer as mulheres adicionando o suplemento especial para mulheres. O Magdeburger Volkstimme é um exemplo e o camarada Goldstein no Zwickau tem estimulado habilidosamente e com sucesso. Mas até agora a imprensa diária manteve a trabalhadora como assinante, enaltecendo sua ignorância, seu gosto ruim e informe, no lugar de esclarecê-las.

Repito que estou apenas colocando sugestões para vossa consideração. Propaganda entre as mulheres é difícil e onerosa e requer grande devoção e sacrifício, mas este será recompensado e deve ser trazido à luz. O proletariado poderá se libertar apenas se lutar unido, sem diferenciar-se por nacionalidade ou profissão. No mesmo sentido, só se libertará sem a distinção por sexo. A incorporação de grandes massas de trabalhadoras na luta pela libertação do proletariado é um pré-requisito para a vitória do ideal socialista e para a construção da sociedade socialista.

Apenas a sociedade socialista irá resolver o conflito que hoje é gerado pela atividade profissional das mulheres. Uma vez que a família como uma unidade econômica irá desaparecer e seu lugar será tomado pela família como uma unidade moral, as mulheres terão igualdade em direitos, igual em criatividade, será companheira de frente de seu marido; sua individualidade poderá crescer no mesmo tempo e ela cumprirá suas tarefas de esposa e mãe da melhor forma possível.

Fonte: www.marxists.org

Primeira Edição: Discurso ao congresso do Partido da Social Democracia da Alemanha, Gotha, 16 de Outubro de 1896. Berlim.

Fonte: Clara Zetkin: Escritos Selecionados, ed. Foner, tradução para o Inglês: Kai Schoenhals, International Publishers, 1984. Texto em inglês em http://www.marxists.org/archive/zetkin/1896/10/women.htm
Tradução para o Português: M. Silva.
HTML: Fernando A. S. Araújo
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